Por José de Castro – São Paulo
O dólar fechou em leve queda ante o real nesta quinta-feira, mas ficou longe das mínimas da sessão, refletindo persistentes incertezas sobre mais ajuda fiscal nos EUA antes da eleição norte-americana.
A divisa chegou a cair quase 1% no começo da tarde, antes de recobrar fôlego em meio à instabilidade nos mercados externos e a um pregão de dólar em alta contra outros rivais.
A cotação negociada no mercado à vista caiu 0,38%, a R$ 5,594 na venda – após oscilar entre alta de 0,19% (para R$ 5,627) e queda de 0,95% (a R$ 5,563).
No exterior, moedas emergentes pares do real tinham desempenho misto, enquanto o índice do dólar frente a uma cesta de seis rivais de países ricos subia 0,25%, deixando as mínimas em sete semanas atingidas na véspera.
Apesar de a presidente da Câmara dos Deputados dos EUA, Nancy Pelosi, continuar a dizer que as tratativas estavam fazendo progresso, comentários do presidente Donald Trump feitos na quarta-feira colocaram em dúvidas o desenrolar das negociações.
No Twitter, Trump acusou democratas de não estarem dispostos a encontrar um acordo aceitável, em meio à profunda oposição entre os parlamentares do próprio partido do presidente do Senado a um novo pacote de estímulo.
O entrevero reforça avaliações do mercado de que uma vitória democrata na eleição de 3 de novembro tende a ser mais positiva para ativos de risco.
“As moedas emergentes já estão tendo um rali em antecipação, portanto, a direção da viagem é clara”, comentou no Twitter Robin Brooks, economista-chefe do Instituto de Finanças Internacionais (IIF, na sigla em inglês).
“Mais fundamentalmente, menos incerteza política e menos ênfase na desglobalização são (fatores) positivos para a demanda global e os preços das commodities. Isso é bom para os mercados emergentes”, completou.
Um índice de moedas emergentes acumula alta de 1,9% em outubro, a caminho do melhor desempenho mensal desde dezembro de 2019.
O real também se valoriza, mas apenas 0,43%, ficando bem aquém de vários de seus pares. E analistas avaliam que, embora o exterior possa oferecer algum “colchão”, os temas domésticos, sobretudo do lado fiscal, vão continuar pesando sobre a divisa no curto prazo.
“O valuation (preço relativo) está atrativo, o que poderia dar algum suporte ao real num cenário (doméstico) negativo, mas tampouco vejo a moeda como o melhor ativo num cenário positivo, diante do juro baixo e do overhedge [cobertura adicional ao valor do próprio investimento], para citar alguns motivos”, disse Bernardo Zerbini, um dos responsáveis pela estratégia da gestão macro da gestora AZ Quest.
O juro baixo reduz a atratividade da renda fixa brasileira aos olhos dos investidores estrangeiros, o que prejudica o cenário para fluxo cambial –afetando, assim, a perspectiva para ingresso de dólares no mercado doméstico.
Já o desmonte do overhedge – proteção cambial adicional adotada por bancos e cuja eficiência foi colocada em xeque diante de mudanças, anunciadas neste ano, em regras tributárias -pode implicar compra de mais cerca de US$ 15 bilhões até o fim do ano, segundo cálculos de algumas instituições financeiras, num período já tradicionalmente marcado por pressão cambial devido a saídas de recursos.
Enquanto isso, seguem os receios sobre as contas públicas. Autoridades do governo, entre elas o presidente Jair Bolsonaro e o ministro da Economia, Paulo Guedes, reforçaram nos últimos dias a defesa das regras fiscais, mas o mercado continua preocupado com riscos de alguma flexibilização, principalmente, no dispositivo do teto de gastos, que limita o aumento de gastos à inflação.
“Nosso cenário-base contempla cumprimento do teto, mas também com algum risco de um ‘drible minimamente controlado’, se é que é possível dizer isso”, disse Helena Veronese, economista-chefe na Azimut Brasil Wealth Management, para quem um “rompimento” sem constrangimento do limite de despesa imposto pelo mecanismo poderia levar o dólar para perto de R$ 6.